A Reforma Tributária aprovada pela Emenda Constitucional nº 132/2023 trouxe mudanças profundas para empresas em todo o país. Uma das principais novidades foi a substituição do ICMS pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), um tributo mais simples, arrecadado no destino e sem espaço para concessão de incentivos fiscais pelos estados. Com isso, surgiram dúvidas: o que acontece com os incentivos concedidos até aqui? Empresas que fizeram investimentos baseados em benefícios fiscais estaduais perderão tudo?
Para lidar com essa transição, o governo instituiu o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais do ICMS, regulamentado pela Lei Complementar nº 214/2025. O fundo prevê o repasse de R$ 160 bilhões da União entre 2025 e 2032, destinado a compensar empresas que, até maio de 2023, recebiam incentivos fiscais estaduais regulares, por prazo determinado e com obrigações contratuais.
O objetivo declarado é garantir segurança jurídica às empresas que atuaram de boa-fé. Muitas firmaram contratos ou expandiram operações confiando em incentivos estaduais válidos. O fim abrupto desses incentivos poderia ser interpretado como quebra de compromisso do Estado, o que abriria espaço para judicialização e instabilidade econômica.
A LC nº 214/2025 estabeleceu critérios bastante claros:
– O benefício deve ter sido oneroso (com contrapartidas exigidas da empresa);
– Precisa ter sido concedido por prazo certo, com regras claras;
– Deve ter sido concedido até 31 de maio de 2023 e registrado conforme a LC nº 160/2017;
– A empresa precisa estar em dia com suas obrigações fiscais.
A Receita Federal será a responsável pela análise dos pedidos. Isso traz um desafio institucional: embora os benefícios fossem estaduais, o órgão federal centralizará o processo de verificação, o que exigirá cooperação com os fiscos estaduais.
Apesar da boa intenção, o fundo não está isento de críticas. Uma delas é que ele pode perpetuar distorções típicas do antigo ICMS, beneficiando empresas que só sobrevivem por conta de incentivos. Outro ponto é que o fundo não exige comprovação de produtividade, inovação ou competitividade, tratando empresas eficientes e ineficientes da mesma forma.
Além disso, os R$ 160 bilhões previstos pesam no orçamento federal e levantam preocupações sobre o impacto nas contas públicas, juros e inflação. O gasto pode ser justificado se resultar em estabilidade e manutenção de empregos, mas, se mal direcionado, corre o risco de desperdiçar recursos em empresas pouco viáveis no novo ambiente tributário.
Empresas que atendem aos requisitos devem iniciar o processo de habilitação o quanto antes. A regulamentação traz detalhes sobre documentos exigidos, prazos e formas de cálculo do valor compensável. O ideal é contar com suporte técnico para garantir que todo o histórico do benefício esteja bem documentado e em conformidade.
A exclusão de determinados benefícios pode gerar disputas judiciais. Empresas que fizeram investimentos baseadas em promessas de incentivo podem alegar quebra de expectativa legítima. Nesses casos, a via judicial pode ser uma alternativa — embora lenta e incerta.
O Fundo de Compensação é um mecanismo de transição. Seu sucesso dependerá da capacidade do governo de aplicar os recursos com transparência, evitar abusos e ajustar o modelo, se necessário. Já para as empresas, o momento exige adaptação e estratégia. A era dos incentivos fiscais estaduais está chegando ao fim, e quem não se preparar para competir num ambiente tributário neutro pode enfrentar dificuldades.
Por isso, é essencial que as empresas:
– Avaliem sua dependência de benefícios fiscais;
– Simulem o impacto da reforma tributária nos seus custos;
– Adotem medidas de compliance tributário;
– Contem com suporte jurídico e contábil especializado para eventuais processos de habilitação ou revisão.